Uma noite de lua pálida e gerânios
ele virá com a boca e mão incríveis
tocar flauta no jardin.
Estou no começo do meu desespero
e só vejo dois caminhos:
ou viro doida ou santa.
Eu que rejeito e exprobo
o que não for natural como sangue e veias
descubro que estou chorando todo dia,
os cabelos entristecidos,
a pele assaltada de indecisão.
Quando ele vier, porque é certo que vem,
de que modo vou chegar ao balcão sem juventude?
A lua, os gerânios e ele serão os mesmos
– só a mulher entre as coisas envelhece.
De que modo vou abrir a janela, se não for doida?
Como a fecharei, se não for santa?
Adélia Prado é escritora, romancista, poeta e filósofa ligada ao Modernismo. Considera a poetisa mais vista do Brasil, a mineira, em 2024 ganha o prêmio Camões (ilustre premiação literária portuguesa aos países lusófonos), sendo a terceira brasileira ganhá-lo.
Com uma escrita que permeia a perplexidade humana, o estilo único de Adélia Prado é uma chave encantadora para a literatura nacional.